"Evento extremo no RS": como o Brasil investirá R$ 200 milhões para melhorar a previsão do t
Projeto busca reduzir o tempo para estimar efeitos de fenômenos climáticos no país. Desenvolvimento seguirá até 2033, com entrega do primeiro produto no próximo ano. Software mostrou bons resultados nos testes iniciais, segundo pesquisadores
Pesquisadores brasileiros trabalham no desenvolvimento de um modelo matemático para qualificar a previsão do tempo no país. Batizado de Monan – “terra sem males” na cultura tupi-guarani –, a iniciativa receberá investimento de R$ 200 milhões até 2033 e contará com um supercomputador para operar o sistema.
Entre os objetivos está melhorar a capacidade de estimar eventos extremos, como a crise climática que atingiu o Rio Grande do Sul neste ano.
A plataforma é projetada para analisar fenômenos atmosféricos a partir de informações captadas nas redes observacionais – estações meteorológicas, satélites, radares e GPS são exemplos.
Os dados dos equipamentos são processados por meio de linguagens de programação. O Monan tem como base o software MPAS, desenvolvido nos Estados Unidos.
— Na primeira etapa do projeto, está sendo configurado o modelo matemático para simular melhor os processos físicos presentes na atmosfera sobre a América do Sul. Nosso alvo é ter uma previsão com uma confiabilidade maior do que temos hoje — resume Paulo Yoshio Kubota, pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e um dos responsáveis pelas implementações das formulações matemáticas.
Kubota afirma que o Monan teve resultados mais precisos na previsão do deslocamento de massas de ar e simulações de ciclones extratropicais em comparação a outros modelos disponíveis hoje.
Isso significa que a tecnologia consegue estimar melhor o comportamento das frentes atmosféricas e as mudanças físicas que ocorrem ao longo do trajeto delas. Os resultados indicam que o modelo matemático é capaz de informar antes e com mais detalhes a ocorrência de fenômenos como chuvas excessivas e ondas de calor.
— A maioria dos modelos conseguiu prever que ocorreria excesso de chuva no Rio Grande do Sul (em abril e maio deste ano), mas não a intensidade. Acredita-se que o Monan proporcionaria uma amplitude maior. É um modelo que ajudaria muito na previsão desse evento extremo no Estado — comenta Kubota.
O ônus é que o modelo exige mais capacidade de processamento de dados. Por isso, o projeto prevê a compra de um supercomputador. O edital foi divulgado neste mês; após a aquisição, a estrutura será instalada na unidade do Inpe em Cachoeira Paulista, no interior de São Paulo.
As atividades são feitas por um comitê científico composto por 32 pesquisadores – dois deles de instituições do Rio Grande do Sul.
O investimento será feito pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), por meio de recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT). O projeto começou em 2021 e deve ser finalizado em 2033.
Segundo o governo federal, a expectativa é de que em agosto deste ano comecem os treinamentos para a utilização o modelo. O cronograma de entregas prevê que o primeiro produto entre em operação em 2025.
União de dados
Segundo Fabrício Pereira Harter, meteorologista e professor da Universidade Federal de Pelotas (Pelotas), um dos benefícios do desenvolvimento é integrar informações sobre o clima no país.
— Ele vai unificar modelos de atmosfera, oceano, criosfera, dispersão de poluentes, clima espacial e mudanças climáticas em diferentes escalas de tempo e espaço. Os fenômenos não são isolados: a atmosfera, o oceano e a superfície não estão separados. Quando juntamos tudo isso, temos uma resposta melhor — resume o estudioso, que faz parte do comitê científico do Monan.
Harter diz que o sistema terá código aberto – ou seja, poderá ser usado e alterado por qualquer pessoa – e gratuito. Por isso, pesquisadores e interessados no tema poderão utilizar os dados e fazer os próprios estudos ou analisar os resultados dos mapas disponibilizados pelo Monan. A possibilidade reforça a ideia de um sistema comunitário de previsão do tempo no país (conheça mais sobre o projeto na plataforma Github).
Com o supercomputador, o Brasil terá um equipamento que representa o “estado da arte” nesse tipo de tecnologia.
— Embora seja um grande passo na capacidade de computação, precisamos ter um parque computacional, com atualização contínua, para acompanharmos os países desenvolvidos. Outra demanda importante é melhorarmos nossa rede de observações de dados meteorológicos — argumenta.
Informações para de curto e longo prazo
O Monan será preparado para realizar previsões em diferentes escalas de tempo: nowcasting (até seis horas), tempo médio (até 15 dias), subsazonal (entre 15 e 30 dias), sazonal (próxima estação) e mudanças climáticas (de 10 a cem anos).
Isso dará informações para o país lidar com eventos extremos em diferentes contextos, segundo Elisa Helena Fernandes, professora do Instituto de Oceanografia da Universidade Federal do Rio Grande (FURG).
— A qualificação das previsões de curto e médio prazo será importante para garantir a efetividade de ações da Defesa Civil na salvaguarda da população e do patrimônio. Previsões em escala subsazonal, sazonal e decenais permitirão uma adaptação do Estado aos cenários de mudanças climáticas do futuro — pontua a especialista, também integrante do Monan.
A pesquisadora explica que o primeiro produto em desenvolvimento, a previsão de tempo médio, já revelou um ganho: uma resolução global de 10 quilômetros e refinamento de três quilômetros para a América do Sul.
— Isso representa uma resolução quatro vezes melhor para o Brasil e garante uma previsão mais precisa sobre onde, quando e qual a intensidade da chuva na região — afirma.
Fonte: GZH
Imagem: Reprodução / Ministério da Ciência,Tecnologia e Inovação
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