Com as videiras em dormência, inverno é tempo de poda nos parreirais da Serra
É no inverno, enquanto as parreiras em dormência recarregam suas energias para voltar a brotar na primavera, que produtores como os irmãos Gustavo e Cristiano Mariani, e seu pai, Pedro, cujo trabalho esta série irá acompanhar durante todo o ciclo da uva, encaram a lida mais pesada. Por seis semanas, a poda das videiras irá exigir paciência e algum preparo físico para os bento-gonçalvenses passarem de oito a 10 horas com os braços levemente erguidos, enquanto suas mãos seguram as tesouras que irão cortar algumas centenas de galhos por dia.
- A gente começou na última semana de julho, vai todo agosto, até um pedacinho de setembro. Cada dia bom tem de ser aproveitado - destaca Gustavo Mariani, 45, produtor de Bento Gonçalves.
O sono ideal das parreiras pode durar de 400 até 600 horas abaixo de 10ºC de temperatura, variando de acordo com cada tipo de uva plantada. Se a carga for atingida, provavelmente a planta terá absorvido a energia necessária para brotar com todo seu vigor, oferecendo cachos de uva em todas as gemas de cada galho. As gemas, ou, no popular da imigração italiana, os olhos, são embriões localizados nos ramos e nas bases da videira, que irão gerar os brotos e posteriormente os cachos de uva.
Ainda que se estenda por mais de um mês, o calendário da poda deve ser respeitado com rigor, a fim de permitir que a parreira possa fazer sua parte ao sair da dormência. Iniciar a poda mais cedo pode fazer antecipar a brotação, bem como realizar a poda tardia pode prejudicar os brotos mais prematuros.
Família Mariani reunida para fazer o trabalho meticuloso da poda, que se estende por cerca de seis semanasBruno Todeschini / Agencia RBS
- Este inverno começou com muita chuva, mas depois estabilizou e veio o frio que a gente esperava. Quanto mais frio, mais a videira consegue descansar e reunir a energia que ela precisa. Quando isso acontece, todas as gemas vão dar cachos. A gente só precisa torcer ainda para que não dê geada ou um frio mais intenso fora de época, que vá prejudicar a brotação - explica Cristiano Mariani, 36, irmão de Gustavo.
Desde a última semana de julho, até meados de setembro, os irmãos Mariani e o pai, Pedro, irão dedicar de oito a 10 horas de cada dia seco para realizar a poda nos sete hectares plantados. Nicolas, filho de Gustavo, ajuda o pai, enquanto Pedro irá ajudar Cristiano com suas parreiras Durante as férias escolares, a equipe ganhou o reforço de Davi, 9. Ainda muito jovem para o trabalho, o menino é encarregado de recolher as pedras bonitas que encontra no terreno. Entendido do assunto, Davi discorre sobre ametistas e granitos, e precisa apenas de uma rápida análise para saber se a pedra seguirá com ele.
Davi Mariani, de 9 anos, se diverte encontrando pedras bonitas o suficiente para levar a uma gruta que fica na casa da avóBruno Todeschini / Agencia RBS
- Se a pedra for bonita eu levo comigo para colocar numa gruta que tem na casa da minha vó - conta.
Embora seja a estação que mais exija a intervenção do produtor, as horas diárias dedicadas à poda na família Mariani se concentram entre a segunda e a sexta-feira, nos dias de tempo seco. No máximo a manhã de sábado também será de labuta, a depender do quão produtiva foi a semana. Mas o restante do sábado e o domingo serão de descanso, de jogar uma partida de futebol com os amigos ou de se reunir em família para confraternizar.
- A gente prefere ter uns cifrões a menos, mas viver uns anos a mais - resume Gustavo Mariani.
A primavera chega primeiro numa sala fechada
Juciel Cardoso, engenheiro agrônomo da Aurora, mostra como funciona projeto que simula as condições da primavera para antecipar a brotaçãoPorthus Junior / Agencia RBS
Enquanto a primavera não chega no hemisfério no Sul, em uma sala não muito grande numa das sedes da Cooperativa Vinícola Aurora, de Bento Gonçalves, ela já chegou. Pelo menos assim serão enganados os galhos de videira colocados na câmara de forçagem, espaço que simula as condições climáticas da primavera, numa tentativa de simular o comportamento que a videira terá quando chegar o período de brotação.
Quem explica como funciona este trabalho, desenvolvido junto aos cooperados há cinco anos, é o engenheiro agrônomo da Aurora Juciel Cardoso.
_ O projeto tem o intuito de analisar, dentro do galho, onde está localizada a maior quantidade de inflorescências, ou o conjunto de flores que, após o período vegetativo, vão se tornar o cacho de uva. Neste projeto a gente avalia a quantidade de inflorescências antes da parreira brotar, para levar a informação ao nosso produtor e auxiliá-lo no manejo da poda.
Os galhos cortados são fixados na areia, dentro de caixas de plástico. Durante o período de cerca de 25 dias em que os galhos estarão na câmara, a combinação dos fatores temperatura, umidade e luminosidade que se espera dos dias de primavera irá forçar a brotação.
Fabiano Orsatto (D), produtor, é um dos beneficiados pelo projeto que há cinco anos é desenvolvido pela Aurora junto a seus cooperadosBruno Todeschini / Agencia RBS
- A gente tenta adiantar o ciclo da videira, simulando as condições previstas para acontecer com o vinhedo na primavera. Ainda nos meses de abril, maio e junho a gente faz a coleta dos galhos na propriedade do cooperado, para avaliar essa fertilidade. No momento da poda, o produtor já tem uma noção de onde está a maior quantidade de inflorescência no galho da sua parreira - acrescenta o engenheiro.
Um dos cooperados beneficiados pelo projeto, Fabiano Orsatto, 49, também de
Bento Gonçalves, explica a diferença que o teste de fertilidade das gemas fez para o seu cultivo, que soma 14 hectares plantados de variedades de uvas para suco, em especial a bordô:
- O resultado desta parceria com o departamento agrícola é fantástico. Consegui aumentar muito a produção, porque o levantamento que eles nos entregam é muito preciso. Facilita a colheita, dá cachos maiores e com mais qualidade. E é claro que isso ajuda a dar o ganho financeiro que a gente precisa.
Fonte: Pioneiro / Gaúcha ZH
Foto: Bruno Todeschini / Agencia RBS
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