Pesquisadores desenvolvem vacina brasileira contra a malária vivax
É o primeiro imunizante no mundo para este tipo da doença, responsável por 80% dos casos registrados de janeiro a outubro deste ano no Brasil
Uma vacina brasileira contra o tipo mais comum de malária no país e em regiões das Américas, a Vivaxin, está em fase de patente e deve ter o pedido de testes em humanos protocolado em agências reguladoras até janeiro.
O imunizante contra o Plasmodium vivax passou pela fase pré-clínica para avaliar qualidade, eficácia e segurança, com resultados promissores.
Atualmente, não existe uma vacina contra a malária vivax, doença infecciosa causada pelo parasita do gênero Plasmodium e transmitida para humanos pela picada de fêmeas de mosquitos Anopheles. Há três espécies mais comuns do parasita no Brasil – vivax, falciparum e malariae. Apenas contra a segunda a Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda, desde 2021, a vacinação em crianças em alguns países da África subsaariana.
Chamado de Vivaxin, o imunizante passou por testes de boas práticas de laboratório (BPL) e de fabricação (BPF).
— Temos um produto inédito no mundo e inteiramente produzido no Brasil. Meu objetivo desde o início da pesquisa, há mais de 10 anos, foi conseguir uma vacina — diz a professora da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo (FCF-USP) Irene Soares.
Irene foi a coordenadora do trabalho, juntamente com o professor Ricardo Gazzinelli, diretor do Centro de Tecnologia de Vacinas (CT-Vacinas) e coordenador do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia de Vacinas (INCT-Vacinas).
O pedido de patente foi feito no final de outubro por meio da Agência USP de Inovação e do Centro de Transferência e Inovação Tecnológica da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). A patente protege o processo de produção e formulação final com adjuvante desenvolvido pela equipe do CT-Vacinas. Os resultados dos últimos testes devem ser publicados em breve em revista científica.
Além disso, os pesquisadores já haviam demonstrado, em artigo publicado em abril na Vaccine, que o imunizante foi capaz de induzir níveis altos de anticorpos em camundongos e coelhos, mostrando-se seguro e bem tolerado.
Como é a vacina
A formulação apresentada combina em uma única molécula três diferentes formas genéticas, as chamadas variantes alélicas, de uma proteína do Plasmodium vivax, a PvCSP (proteína circunsporozoíta), com o objetivo de aumentar a eficácia e proteger contra todas as variações.
Diferentemente do parasita falciparum (mais comum no continente africano), a proteína-alvo do vivax tem três formas alélicas –VK210, VK247 e P. vivax-like. Ela se tornou alvo por ser o componente mais abundante na superfície dos esporozoítos – forma alongada do parasita presente na glândula salivar do mosquito transmissor e que infecta o ser humano, contaminando o fígado. Apresenta uma área que se liga aos receptores celulares e aos anticorpos.
No estudo com a nova formulação, os anticorpos produzidos pelos camundongos imunizados reconheceram as três variantes, conseguindo, em alguns casos, prevenir completamente a infecção (proteção estéril) e, em outros, retardar o aparecimento dos parasitas no sangue.
Nos últimos anos, os cientistas testaram alguns adjuvantes visando reforçar a ação do imunizante. Um desses testes resultou em outro artigo, também publicado em abril, na revista Frontiers in Immunology, com o apoio da FAPESP.
A pesquisa recebe apoio da FAPESP por meio de um Projeto Temático. O grupo obteve recurso do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico e da Financiadora de Estudos e Projetos.
Situação da malária
Considerada endêmica na região amazônica e um problema de saúde pública global, a malária provoca febre, calafrios, tremores, sudorese e dor de cabeça. Em casos graves leva a convulsões, hemorragias e alteração da consciência. Normalmente, o paciente recebe tratamento em regime ambulatorial, com comprimidos fornecidos gratuitamente pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
De janeiro a outubro deste ano, o Brasil registrou 117.946 casos da doença, sendo que 80% deles (95.113) foram provocados pelo Plasmodium vivax, segundo o Ministério da Saúde. Situação preocupante tem sido detectada entre indígenas – foram cerca de 45.100 casos até setembro, um aumento de 12% em relação ao mesmo período de 2023.
No último Dia Mundial contra a Malária, comemorado em 25 de abril, a Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) pediu aos governos que intensifiquem os esforços de enfrentamento à doença, que tem impacto maior para povos indígenas, migrantes e populações em situação de vulnerabilidade.
No ano passado, os países das Américas relataram cerca de 480 mil casos de malária. Embora o número venha diminuindo desde 2017 (quando foram 934 mil registros), alguns países ainda estão longe de alcançar a meta de redução de 75% até 2025.
Fonte: Gaúcha ZH
Foto: CT-Vacinas / UFMG
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