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Sob pressão de comunidades afetadas, RS finaliza ajustes para leiloar novo bloco de rodovias

  • Data: 19/Mai/2025

Secretaria de Parcerias espera divulgar plano de concessão de estradas no Norte e no Vale do Taquari ainda em maio, com preço médio abaixo dos R$ 0,23 por quilômetro apresentados inicialmente

O governo gaúcho pretende apresentar, ainda neste mês, a versão final do projeto que concede 415 quilômetros de sete rodovias à iniciativa privada com a intenção de promover melhorias de infraestrutura mediante cobrança de pedágio. O chamado Bloco 2 das concessões engloba rodovias de pista simples que se estendem entre as regiões Norte e Vale do Taquari.

O maior trabalho do corpo técnico é fazer ajustes na proposta para atender a demandas apresentadas por representantes das comunidades afetadas, incluindo políticos, empresários e moradores. As pressões por mudanças envolvem principalmente pedidos de redução no valor médio da tarifa, ampliação dos recursos públicos a serem desembolsados e antecipação de obras dentro do cronograma.

Também há prefeitos que discordam da instalação dos 24 pontos de cobrança por temerem um desestímulo à circulação entre cidades próximas. O governo sustenta que vem trabalhando para remodelar o projeto com foco na redução do preço — o Piratini garante que o valor final ficará abaixo da média de R$ 0,23 por quilômetro apresentada inicialmente.

O Piratini prevê investimentos de R$ 6,7 bilhões, ao longo dos 30 anos de contrato, em trechos da RS-128, RS-129, RS-130, RS-135, RS-324, RSC-453 e da BR-470, cuja gestão foi transferida da União para o Estado. A intenção é repassar a administração desses pontos à iniciativa privada, com a contrapartida de realizar melhorias como 244 quilômetros de duplicações e 101 quilômetros de terceiras faixas, além de 16 pontes com cota elevada a fim de prevenir danos de eventuais novas enchentes.

Apoio ao projeto, mas questionamentos à tarifa

Nos últimos meses, ao passar por audiências públicas, o tema despertou diferentes graus de apoio e levantou controvérsias que resultaram em sugestões que o governo estadual diz levar em conta para fazer ajustes no projeto de parceria com a iniciativa privada. Setores empresariais, por exemplo, entendem que não há como fazer melhorias significativas sem passar pela cobrança de pedágios, mas fazem ressalvas ao plano.

Diretor de Infraestrutura da Associação Comercial e Industrial de Lajeado (Acil) e integrante da Câmara da Indústria, Comércio e Serviços do Vale do Taquari, Nilto Scapin defende maior investimento público na composição financeira dos investimentos a fim de baratear a tarifa a ser exigida dos condutores pelo sistema free flow, em que pórticos fazem a leitura de placas ou chips para realizar a cobrança, sem necessidade de praças físicas de pedágio.

— Somos favoráveis à concessão e ao modelo de free flow, mas entendemos que o governo deve fazer um aporte maior do que o anunciado para termos uma tarifa mais justa — sustenta Scapin.

O Piratini já anunciou um repasse de recursos públicos de R$ 1,3 bilhão para tocar parte das obras previstas — o que reduziu o custo por quilômetro ao usuário de R$ 0,32 para R$ 0,23. Scapin entende que o valor poderia subir para até R$ 2 bilhões.

Além disso, o dirigente comenta que o cálculo da tarifa média levou em consideração dados defasados de tráfego — o número real, segundo ele, mais elevado, permitiria manter os investimentos privados com um preço menor de pedágio, já que, na prática, haveria mais veículos circulando do que o estimado.

— O ideal é que a tarifa ficasse na faixa de R$ 0,12 a R$ 0,15 por quilômetro — afirma o diretor da Acil.

Preço por quilômetro será reduzido, diz governo

A Secretaria da Reconstrução Gaúcha sustenta em nota que "o volume de tráfego das rodovias foi aferido em pesquisas de campo e está em linha com o observado nos pedágios".

O texto diz, ainda, que "a redução da tarifa é a principal demanda da sociedade, prefeituras e entidades interessadas no tema" e que, "nesse sentido, o Governo do Estado tem trabalhado na revisão do projeto, com o objetivo de diminuir o valor da tarifa".

"Não será mais R$ 0,23 por quilômetro", diz o comunicado.

A secretaria não informou qual o percentual de redução que poderá ser alcançado. Pelo patamar apresentado anteriormente, uma viagem de Erechim à Capital sairia por R$ 66,54. Já o trecho Arroio do Meio-Lajeado ficaria em R$ 2,17.

Depois de lançado um edital com as regras da concessão do Bloco 2, deve ser realizado um leilão, em São Paulo, para definir o vencedor da licitação. O critério para definir o vitorioso será o de menor aporte público conjugado com o maior desconto na tarifa.

O Bloco 3, que contempla a Serra, já foi concedido. O Bloco 1, ainda em estudos, compreende as regiões Metropolitana, Litoral e Hortênsias.

Projeto enfrenta resistência de prefeitos

Vitor Rosa / Divulgação

Em abril, governador Eduardo Leite apresentou projeto aos prefeitos.Vitor Rosa / Divulgação

O projeto enfrenta críticas de parte dos prefeitos dos 32 municípios por onde passam as rodovias. Presidente da Associação de Municípios do Alto Taquari (Amat) e prefeito de Muçum, Mateus Trojan, defende mudanças significativas.

— É importante frisar que o Estado não está, em margem alguma, dando alternativas entre ter pedágios ou não. Enquanto entidade, nos posicionamos imediatamente contrários à proposta apresentada inicialmente por entender que era excessivamente onerosa e comprometeria o processo de recuperação da região.

O prefeito lista as reclamações e as mudanças propostas pelos municípios.

— Elencamos uma série de demandas e ações, como a preocupação com a posição dos arcos do sistema free flow e a divisão que poderá causar entre comunidades, a solicitação de maior aporte de recursos próprios do governo, a revisão de trechos previstos com duplicação, substituindo por terceiras faixas, com custo bem menor, e a desatualização do cálculo da média de veículos por dia, que certamente geraria impacto nas tarifas — sustenta Trojan.

O prefeito considera ainda "incabível" uma cobrança estimada em R$ 4 em um pórtico localizado na área de Muçum, bastante afetada pelas enchentes.

— Manifestamos isso em todas as audiências e aguardamos que, juntamente com as outras demandas apresentadas, esse ponto do pórtico e o valor previsto sejam revistos.

Trojan entende que é positivo prever obras de infraestrutura para a região, mas entende que é fundamental fazer ajustes que reduzam o ônus dos motoristas.

— Destaco ainda a angústia com a eficácia do cumprimento dos requisitos do edital, pois existem experiências traumáticas de concessão de rodovias na região, o que também gera uma alta desconfiança da comunidade.

Existe também pressão pela antecipação de parte das obras previstas ao longo da concessão. O governo argumenta que R$ 4,5 bilhões seriam injetados nos primeiros 10 anos das três décadas de contrato, mas Nilto Scapin, da Acil, afirma que não é o suficiente.

— As obras estavam muito distantes, além do terceiro ano de concessão. É preciso antecipar algumas obras de duplicação em trechos como o de Venâncio Aires a Encantado e o de Estrela a Teutônia. Já eram gargalos antes da catástrofe das enchentes, depois agravou ainda mais, com congestionamentos, para não falar nas mortes em decorrência da pista simples — afirma o representante do empresariado.

Por meio de nota, a Secretaria de Reconstrução informa que "as solicitações de antecipação de obras nas rodovias do Bloco 2, que, por consequência, resultarão em adiantamento de investimentos e impactos na tarifa, estão sendo avaliadas na revisão da futura concessão". O Piratini sustenta ainda que o sistema free flow é mais justo do que o modelo de pedágios convencionais pelo fato de o usuário pagar tarifas de modo mais fracionado, de acordo com a extensão efetivamente percorrida.

"Perdi 18 conhecidos em acidentes", lamenta artesão

Mateus Bruxel / Agencia RBS

Blume vive há cerca de 30 anos às margens de rodovia.Mateus Bruxel / Agencia RBS

O artesão Guilherme Blume, 63 anos, mora e trabalha a menos de 50 metros da pista simples da RS-453 no trecho em que liga o município de Estrela, onde vive há mais de três décadas, à cidade próxima de Teutônia, no Vale do Taquari.

O escultor teme que a implantação de um pórtico para cobrança de pedágio nas proximidades, prevista no plano de concessão rodoviária do governo gaúcho, comprometa seus deslocamentos quase diários a Teutônia. Mas entende que algo precisa ser feito em relação à segurança rodoviária ao longo da via que compõe a chamada Rota do Sol.

A falta de segurança é uma preocupação frequente das comunidades atendidas por rodovias de pista simples, por vezes com trânsito pesado e falta de melhores intersecções e de passarelas de pedestres.

— Pelas minhas contas, desde que moro aqui, já morreram 18 conhecidos nesse trecho de estrada. O último foi um primo, alguns meses atrás. Em termos de segurança, uma duplicação seria muito melhor — afirma Blume, olhando para o vai e vem de carros e caminhões que, aos finais de tarde, chega a provocar congestionamentos.

De acordo com as estatísticas do Comando Rodoviário da Brigada Militar, apenas desde 2022 (período com informações disponíveis para consulta online) houve 70 acidentes que deixaram pelo menos 80 mortos em toda a RS-453, que compreende ainda outros trajetos como Venâncio Aires-Encantado e Teutônia-Garibaldi, também contemplados pelo plano de concessão do Piratini.

O asfalto apresenta boas condições nos trechos percorridos por Zero Hora, mas a carga de tráfego e os acessos a zonas urbanas aumentam a periculosidade do percurso.

Por volta das 13h15min de quarta-feira, a reportagem flagrou um acidente entre um motociclista e um carro em uma rótula próxima à cidade de Venâncio Aires. O condutor da moto permaneceu estirado sobre o asfalto até a chegada de uma ambulância do Samu que o levou, consciente, para atendimento hospitalar.

— Moro aqui perto, e dá para ouvir o barulho dos acidentes. É preciso duplicar e colocar passarelas, mas acho inadmissível pagar mais pedágio — afirma o morador de Venâncio e prestador de serviços autônomo Guilherme Doss, 33 anos.

Mateus Bruxel / Agencia RBS

Acidente com moto e carro próximo à entrada de Venâncio Aires.Mateus Bruxel / Agencia RBS

Fonte: Gaúcha ZH

Foto: Mateus Bruxel / Agencia RBS

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