Mensagens de ódio e ameaças a escolas crescem na internet, aponta estudo
Ambiente virtual também registra aumento no elogio a autores de ataques. Especialistas analisam os motivos e as consequências desse comportamento no dia a dia de estudantes
Até maio de 2025, foram divulgadas mais de 88 mil publicações de ódio contra o universo escolar nas principais redes sociais utilizadas pelos brasileiros. As mensagens têm como alvo alunos, educadores e as próprias instituições, muitas vezes em tom de ameaça.
Em apenas cinco meses, o número desse tipo de postagem quase chega ao total registrado ao longo de todo o ano passado — 105,1 mil publicações. Quatro anos antes, em 2021, o total era de 43,8 mil mensagens. Os números fazem parte do levantamento realizado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, em parceria com a empresa de monitoramento Timelens.
O crescimento desse comportamento nas redes sociais acompanha o número de ataques a escolas. Entre 2001 e 2018, houve 10 ocorrências em ambiente escolar. Já entre 2019 e 2023, conforme o levantamento, foram 29 casos.
Na terça-feira (8), Vitor André Kungel Gabirazi, nove anos, morreu após um ataque em Estação, no norte gaúcho. O adolescente autor da ação foi apreendido e, segundo a polícia, "não demonstrou arrependimento".
Segundo o delegado José Roberto Lukaszewigz, a Polícia Civil recolheu o celular do adolescente e faz uma varredura em seus acessos e redes sociais para identificar a possível motivação do crime.
Radicalização nas redes
Um dos objetivos do estudo era identificar como os usuários de redes sociais respondem a ataques violentos às escolas. Os dados revelaram que comentários elogiando os agressores saltaram de 0,2% do total de reações às ocorrências, em 2021, para 21%, em 2025.
De acordo com o estudo, essa crescente de ódio e violência entre crianças e adolescentes é reflexo de um ecossistema que oferece aos jovens, principalmente meninos solitários, hiperconectados e emocionalmente desamparados, um local de acolhimento na internet.
— Quando o algoritmo substitui o afeto e a escuta, o risco deixa de ser virtual. Os jovens não estão apenas consumindo conteúdo, estão formando identidade em espaços que valorizam o exagero e a exclusão — comenta Renato Dolci, diretor de dados na Timelens.
Para o pesquisador Fernando Seffner, do Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGEdu) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), "as coisas começam muito antes de começar", em outros ambientes, e agora estão também dentro das escolas.
— Foi-se o tempo em que se escrevia na parede do banheiro. As coisas têm uma dimensão agora que eu considero assustadora. Um quarto da população brasileira está dentro de sala de aula. Uma série de conflitos que aconteciam fora da escola, que a escola não tinha nada a ver com isso, agora acontece dos portões para dentro.
Entre esses conflitos, o especialista cita questões envolvendo gênero e sexualidade.
Os papéis da sociedade, das escolas e dos pais e responsáveis
A psicóloga Bianca Orrico, doutora em Estudos da Criança pela Universidade do Minho, em Portugal, diz que toda a sociedade precisa se envolver no debate sobre a proteção de crianças e adolescentes. Integrante de projetos de educação na SaferNet, entidade que promove a defesa dos Direitos Humanos na internet, a especialista ressalta que o resultado dessas ações também se observa fora das redes.
— Promover a conscientização sobre comportamentos apropriados e respeito mútuo online é fundamental, bem como os impactos negativos dessa violência, buscando falar sobre o tema e até mesmo pensar em intervenções que promovam uma cultura de paz e respeito não só na internet, mas também fora dela — diz Bianca.
Temas como ciberbullying, contato com conteúdos nocivos, uso excessivo das mídias digitais, educação midiática, privacidade e proteção de dados, comportamentos de risco, radicalização política, saúde mental, entre outros, devem ser debatidos nas escolas, analisa a especialista:
— As escolas precisam apoiar os professores, promover a formação sobre essas temáticas e buscar ter na estruturação dos currículos temas que promovam discussões sobre o uso seguro, consciente, crítico e saudável das tecnologias, pois essas questões estão conectadas diretamente à formação cidadã dos estudantes e a defesa de seus direitos dentro e fora das escolas.
Dentro de casa, a psicóloga aponta a proximidade e o diálogo como as melhores estratégias para garantir a segurança das crianças e adolescentes nas redes.
— Conhecer as plataformas que crianças e adolescentes utilizam, conversar sobre segurança e privacidade, promover diálogos sobre respeito, empatia, promoção da diversidade e ter interesse sobre o que eles e elas fazem e com quem interagem online, são algumas estratégias importantes para educá-los sobre como ter um acesso seguro e responsável.
Fonte: GZH
Foto: Jefferson Botega / Agencia RBS
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