Tratamento experimental contra enxaqueca traz esperança a pacientes no RS
Procedimento testado em Passo Fundo bloqueia artéria meníngea e já reduziu crises em pacientes crônicos. Estudo será ampliado para outras cidades
Um tratamento experimental testado em Passo Fundo, no norte do RS, está trazendo esperança para quem sofre de enxaqueca. O método utiliza espécie de “cola” que solidifica uma artéria e interrompe o fluxo sanguíneo, quebrando o ciclo da dor.
O estudo é conduzido pelos neurocirurgiões José Vanzin e Luciano Manzato, do Hospital de Clínicas de Passo Fundo (HC). Na primeira etapa, 10 pacientes da região foram submetidos ao procedimento intervencionista que bloqueia a circulação da artéria meníngea média.
— O cérebro em si não dói. O que dói é a meninge e alguns nervos cervicais. A ideia é inativar essa meníngea e tirar ela dessa equação, desse círculo vicioso da dor — explica Vanzin.
O grupo tratado na primeira fase do estudo foi composto por nove mulheres e um homem com idades entre 19 e 70 anos. Todos apresentavam enxaqueca crônica, quando o paciente tem 15 ou mais crises por mês durante pelo menos três meses.
Os pacientes não foram escolhidos por acaso: a predominância feminina, explicam os médicos, está relacionada à influência hormonal. A enxaqueca afeta 18% das mulheres e 6% dos homens.
Para Manzato, os resultados preliminares da pesquisa, publicados na revista internacional Interventional Neuroradiology, foram animadores:
— Dos 10 pacientes avaliados, sete ficaram sem remédios para enxaqueca após seis meses. Os outros três tivemos que retornar com um antidepressivo simples, que é geralmente um dos primeiros passos para quem tem enxaqueca. Eles tiveram uma que outra crise, mas são esporádicas e não impactam a vida.
A segunda fase do estudo deve envolver cerca de 150 pacientes e será ampliada para outros locais, como Caxias do Sul, Florianópolis (SC) e Rio de Janeiro (RJ). O primeiro procedimento da nova etapa foi realizado em Passo Fundo na primeira semana de outubro.
Além da dor de cabeça
Estudo é conduzido pelos neurocirurgiões Luciano Manzato (E) e José Vanzin.Tatiana Tramontina / Agencia RBS
A enxaqueca pode ter diferentes origens, da genética ao ambiente, e não tem cura. De acordo com Vanzin, não se trata apenas de uma dor de cabeça, mas de um processo químico e inflamatório.
Conforme o médico, entre os gatilhos mais comuns estão estresse, sono irregular, jejum prolongado, alimentos como queijo, chocolate e vinho tinto, além de perfumes fortes e produtos industrializados.
A doença costuma provocar dor unilateral e latejante, sensibilidade à luz e ao som, náuseas e até alterações visuais (auras), quando o paciente enxerga pontos luminosos ou perde parte do campo de visão. O tratamento envolve antidepressivos, anticonvulsivantes, anti-hipertensivos, toxina botulínica e anticorpos monoclonais, método mais moderno específico para enxaqueca.
— A automedicação, ou o excesso de medicação para enxaqueca, produz dor de cabeça. A pessoa acha que toma a medicação para melhorar e ele (o medicamento) está causando a dor de cabeça — alerta Vanzin.
— Nosso estudo busca ajudar justamente aqueles pacientes que já tentaram todas essas opções e continuam com crises incapacitantes — complementa Manzato.
“Voltei a viver normalmente”
Excesso de medicação pode piorar a enxaqueca.Júlio Cordeiro / Agencia RBS
A agricultora Margarete da Silva de Jesus, 43 anos, é uma das 10 pessoas que participaram da primeira fase do estudo. Ela conviveu com enxaquecas severas por quase duas décadas, que se tornaram diárias e impossibilitavam o trabalho e a vida social.
— A dor era tão forte que às vezes eu pensava em bater a cabeça na parede. Nenhum remédio fazia efeito, eu já não tinha vontade de sair e fazer passeios porque a dor era muito forte. Queria ficar sempre quieta ou trabalhando, para ver se esquecia da dor — lembra.
Depois de tentar diversos tratamentos sem resultado, Margarete conheceu o neurocirurgião Luciano Manzato e aceitou participar do estudo. Ela passou pelo procedimento de bloqueio da artéria meníngea média em maio de 2024.
— Nos primeiros dias ainda senti dor, mas foi diminuindo. Hoje tenho uma dor leve às vezes, quando estou estressada, mas nada comparado ao que era antes. Voltei a trabalhar, cuidar da casa e viver normalmente — comemora.
Como participar da pesquisa
Pacientes interessados em participar da triagem para a segunda fase do estudo podem entrar em contato com o Serviço de Neurologia e Neurocirurgia (SNN) do Hospital de Clínicas pelo telefone (54) 3317-6000. A participação é gratuita, com avaliação e exames realizados pelo SUS.
Fonte: Gaúcha ZH
Foto: Tatiana Tramontina / Agencia RBS
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