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Supertempestade solar pode "desligar" a tecnologia da Terra? Veja o que diz a ciência

  • Data: 27/Out/2025

Fenômeno faz parte do comportamento natural do Sol; especialista explica por que a Terra está protegida e o que realmente pode ser afetado

De tempos em tempos, as redes sociais voltam a se encher de vídeos, simulações e previsões alarmistas sobre o mesmo tema: uma possível "supertempestade solar" capaz de queimar satélites, deixar o planeta sem internet e causar apagões globais

As publicações, quase sempre acompanhadas de imagens do Sol em erupção e de títulos apocalípticos, despertam curiosidade e medo.

Segundo a professora Alejandra Daniela Romero, do departamento de Astronomia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), as tempestades solares são fenômenos naturais e cíclicos, parte do comportamento normal do Sol. A diferença está apenas na intensidade.

— Nosso Sol muda ao longo do tempo. Ele passa por um ciclo, que chamamos de ciclo solar, descoberto pelo alemão Samuel Henrich Schwabe em 1843, com duração média de 11 anos. Esse ciclo tem a ver com o campo magnético do Sol, que é como um ímã que vai se invertendo — explica Alejandra.

O que são tempestades solares?

O Sol é uma estrela ativa. Ele passa por ciclos de cerca de 11 anos, marcados por variações no seu campo magnético. Em cada ciclo, o astro passa por um mínimo solar, quando está mais calmo, e um máximo solar, quando suas erupções se intensificam.

Durante esse período de maior atividade, surgem mais manchas solares, regiões onde o campo magnético é muito intenso. É dessas áreas que vêm as ejeções de massa coronal, que são grandes jatos de partículas e energia lançados para o espaço.

A Terra, com sua atmosfera e seu campo magnético, sabe se defender. Não somente isso, mas também sabe nos proteger

ALEJANDRA DANIELA ROMERO

Professora do departamento de Astronomia da UFRGS

 

Quando o material é mandado à Terra, parte interage com o campo magnético terrestre, provocando o que os cientistas chamam de tempestade geomagnéticao equivalente, no espaço, a uma tempestade atmosférica.

O efeito bonito é conhecido: as auroras boreais e austrais, que tingem o céu com tons de verde, rosa e lilás em regiões próximas dos polos. O mais temido, por outro lado, é o impacto que essas descargas podem ter sobre sistemas elétricos e de comunicação.

— Uma tempestade solar é como uma grande corrente elétrica sendo expulsa do Sol. Se essa corrente passasse direto pela Terra, seria como uma sobrecarga elétrica gigante. Quando você faz passar uma corrente muito grande por um fio, ele derrete ou queima. É algo semelhante, mas em escala astronômica — descreve a professora. 

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Tempestades solares causam as belas auroras boreais e austrais.waichi2013th / adobe.stock.com

Qual a maior tempestade da história moderna?

Em 1859, uma dessas tempestades entrou para a história como o Evento de Carrington, batizado em homenagem ao astrônomo britânico Richard Carrington, que observou a erupção. 

O fenômeno foi tão intenso que as auroras foram vistas até o sul de Cuba e do Havaí, enquanto no hemisfério sul chegaram ao norte do Chile. Na época, o mundo vivia ainda na era do telégrafo, e foi o suficiente para causar estragos, com faíscas e até incêndios. Foi o primeiro registro claro de que uma atividade solar podia interferir diretamente na tecnologia humana.

— No passado, nos anos 1970 e 1980, houve também uma tempestade que afetou a rede elétrica do Canadá, em 1989, no Quebec, mas desde então muita coisa evoluiu. A tecnologia foi desenvolvendo mecanismos de proteção e alerta — explica Alejandra.

"Apagão total"? Especialistas explicam por que não

Atualmente, o temor de que um evento semelhante hoje derrube redes elétricas ou apague o planeta inteiro é exagerado, segundo a cientista. Mesmo uma supertempestade não "desligaria" a tecnologia do planeta. 

Para ela, é possível que alguns satélites fossem afetados, mas há redundância, visto que a Terra tem um campo magnético, e a tecnologia tem proteção em diversas frentes. Na prática, isso significa que os possíveis impactos seriam localizados principalmente em regiões como CanadáAlascaEscandinávia Rússia.

— Quanto mais longe dos polos, mais seguro se está. No Brasil, o risco é considerado mínimo. Isso porque estamos muito mais próximos do Equador que dos polos. Claro que o Brasil é tão grande, que o sul está mais perto do polo sul, mas estamos suficientemente longe. Assim, praticamente não há interferência direta — observa a especialista.

O que realmente pode ser afetado?

Mesmo sem catástrofes, os efeitos das tempestades solares existem, e são constantemente monitorados. Os satélites estão no topo da lista de vulnerabilidades. Por isso, são construídos com camadas de blindagem, sistemas de aterramento e mecanismos automáticos de desligamento temporário.

— Os satélites não estão "pelados" no espaço. Eles têm camadas de proteção, como um tipo de isolamento físico, que ajuda a isolar as descargas elétricas. É o mesmo princípio de uma jaula de metal: a corrente circula por fora e não chega ao sistema interno. Isso impede que o satélite queime — explica.

Em voos comerciais, os riscos também são baixos. Aeronaves são projetadas para resistir a descargas elétricas, incluindo as de origem solar. Somente em rotas que cruzam regiões polares  pode haver ajustes de rota em períodos de alta atividade solar.

Já nas redes elétricas terrestres, o "perigo" está nas correntes induzidas. Linhas de transmissão e tubulações metálicas podem sofrer sobrecargas, como já aconteceu no Canadá. Desde então, sistemas elétricos modernos contam com sensores e protocolos de proteção para evitar danos, observa Alejandra.

Como funciona o monitoramento do sol

Muito antes de o tema virar tendência no TikTok, o Sol já era vigiado em tempo real por agências espaciais. A Agência Espacial Norte-Americana (Nasa) e a NOAA (Agência Nacional de Oceanos e Atmosfera dos Estados Unidos) monitoram a atividade solar 24 horas por dia, por meio de satélites especializados que medem radiação, temperatura e densidade do vento solar.

— Essas medições ajudam a prever o comportamento do Sol. Quando há muitas manchas solares, a probabilidade de uma ejeção aumenta, explica Romero.

Os alertas permitem que operadoras de satélites e redes elétricas se preparem. Às vezes, com horas ou até dias de aviso.

E as "superflares"?

Nos últimos anos, pesquisas da Nasa com o telescópio espacial Kepler analisaram mais de 50 mil estrelas parecidas com o Sol e registraram quase 3 mil supererupções, chamadas de superflares. Elas liberam até mil vezes mais energia que uma explosão solar comum.

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Quando o Sol libera energia muito acima da média e a onda magnética atinge diretamente o planeta, o impacto é maior.Artsiom P / adobe.stock.com

A boa notícia é que essas ocorrências parecem muito raras em estrelas com a idade e estabilidade do nosso Sol. Estimativas recentes indicam que um evento desse porte poderia ocorrer, no máximo, uma vez a cada alguns séculos.

— Não acho que veríamos um apagão total. Para isso, a tempestade teria que ser muito, muito grande. E mesmo assim, afetaria apenas a parte da Terra voltada para o Sol — afirma Alejandra. 

Há coisas que representam perigo muito maior para nós, como a mudança climática e os temporais que vivemos aqui no Rio Grande do Sul

ALEJANDRA DANIELA ROMERO

PROFESSORA DO DEPARTAMENTO DE ASTRONOMIA DA UFRGS

Perguntas e respostas sobre as tempestades solares

O que é uma tempestade solar?

É o resultado da interação entre partículas e campos magnéticos do Sol com o campo magnético da Terra. Pode gerar auroras e distúrbios leves em sistemas elétricos e de comunicação.

O que torna uma tempestade "super"?

A intensidade da ejeção solar e o alinhamento exato com a Terra. Quando o Sol libera energia muito acima da média e a onda magnética atinge diretamente o planeta, o impacto é maior.

Existe risco de apagão global?

Não. Os efeitos são localizados e temporários. As redes modernas e os sistemas espaciais possuem redundâncias e protocolos de proteção.

Como o Sol é monitorado?

Por satélites de agências como Nasa e NOAA, que observam radiação, manchas solares e ejeções de massa coronal. Os dados são públicos e atualizados em tempo real.

Devo me preocupar?

Não. O fenômeno é natural e previsível. A Terra e a tecnologia estão preparadas. O mais importante é acompanhar fontes científicas e evitar alarmismos.

Fonte: Gaúcha ZH

Foto: SappawatS / adobe.stock.com

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